domingo, 7 de março de 2010

SOBRE AS NOVAS REGRAS DO JUDÔ

Pelo fato de ter aprendido, praticado e ter sido competidor durante os "annos mirabilis” do Judô Mundial, tenho agora, na condição de professor, a obrigação de argumentar e tecer comentários sobre o artigo de Bruno Doro, do Uol Esportes(1). Sinto certa satisfação nessa argumentação, pois em meus artigos anteriores, “O Judô Moderno"(2) e “Thiago Camilo salva o Judô Mundial"(3) em 2007, venho comentando e divulgando minha preocupação com o Judô nacional e internacional.
As novas regras da Federação Internacional de Judô (FIJ) visam justamente resgatar o Judô que estava sendo descaracterizado por influência de lutadores do Leste Europeu. Adeptos de Sambo (Rússia), Kurash (Uzbequistão) e de outras lutas tradicionais e similares passaram a praticar Judô, pois dessa maneira poderiam participar de campeonatos Internacionais e Jogos Olímpicos. O agarramento nas pernas e levantamentos para arremessar o adversário são técnicas específicas dessas modalidades, e que usadas nas lutas de Judô, permitiram certo incremento vantajoso e competitivo, resultando em inúmeras vitórias, às vezes inesperadas. Tais “técnicas” começaram a ser praticadas e aceitas, ou ignoradas, por dirigentes e árbitros que não estavam preocupados com as tradições do Judô. Muitos atletas no mundo, inclusive alguns brasileiros, também sob influência, passaram a utilizá-las, apesar do nosso Judô sempre ter sido bem próximo e semelhante ao japonês.
Hoje esses lutadores e seus seguidores, com as novas regulamentações, não sabem lutar o Judô na sua essência e assim se acham prejudicados!
Desta forma entendo que não foi nenhuma “decisão radical” da FIJ, e sim uma preocupação de dirigentes que praticaram o verdadeiro e tradicional Judô, que, em tempo, perceberam o mau caminho que estava sendo levada a modalidade e seus princípios. Desde a introdução do koka, yuko e as penalidades em 1974, não se buscava mais o Ippon, a técnica perfeita. Qualquer queda valia alguma pontuação e os atletas e técnicos começaram a adotar táticas de luta para penalizar o adversário por falta de combatividade e saídas da área de luta. A dificuldade para segurar no judogui era evidente e agarrar nas pernas se tornou mais fácil. Fundamentado em técnica e velocidade o Judô japonês, tinha dificuldade para enfrentar adversários que evitavam segurar no judogui e apenas se utilizavam da força física. Assim mesmo o Japão com certa dificuldade em fazer esse tipo de luta, vencia em algumas categorias.
É preciso entender que o Judô é único. Podemos citar o exemplo do Sumo, 23 a.C., padronizado como luta em 710 a.D.(4) se mantém até hoje fiel às suas tradições. Atualmente lutadores da Mongólia, como, Asashoryu e Hakuho (nomes japoneses), que são grandes campeões (Yokozuna) de Sumo no Japão, assim como, Kotooshu da Bulgária aprenderam e praticam o Sumo Japonês. Suas técnicas são as de Sumo e nunca se tentou introduzir ou permitir, qualquer tipo de técnica de lutas estrangeiras nessa modalidade.
Portanto não existe atleta “prejudicado” pelas novas regras, o que existe é falta de conhecimento teórico/prático dos fundamentos do Judô. Prof. Jigoro Kano na sua preocupação pedagógica, também ensinou técnicas de posicionamento do corpo (tai sabaki), técnicas de bloqueio, desvios e técnicas de defesa, fundamentadas no “Sen no Sen” e “Go no Sen”, denominações de 1888, que hoje precisam novamente ser citadas nos comentários das novas regras, uma vez que esses princípios deixaram de ser ensinados e praticados.
A disputa pela pegada (kumi kata) é fruto da falta de orientação. Praticantes e atletas, temerosos em serem dominados e derrubados dificultam o contato direto tomando posições defensivas e abaixando o quadril, não praticando mais as defesas, parte essencial do Judô. Judoca nenhum precisa praticar “novas técnicas” ou “inventá-las”, estão todas classificadas pedagogicamente, desde que o Prof. Jigoro Kano as organizou em 1900. Consequentemente não existe nenhuma “grande mudança”.
O Judô como luta foi criado através de pura técnica embasado no desequilíbrio e arremessos perfeitos, visando o aperfeiçoamento do ser humano num contexto biológico, psíquico e social. Prof. Jigoro Kano preconizava, “... e no Judô a busca pela perfeição técnica e espiritual envolve; conduta moral, disciplina, autocontrole, respeito, seriedade e sinceridade...” e,“...a competição tem validade como meio de avaliação do processo de desenvolvimento pessoal adquirido em sentido amplo, isto é, espiritual, moral e técnico..."(5).
É a essência que lutas ocidentais não possuem.

Odair Borges

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